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Esquina da Rua do Espirito Santo com a Travessa das Almas, Elvas. |
Esta rua liga duas zonas do centro histórico de Elvas que me dizem muito. É a rua que permite ir de casa dos meus avôs paternos a casa dos maternos. É uma rua que tem uma aura que me despertou a atenção e curiosidade desde muito novo.
Se há muitos séculos atrás, ainda antes que chegasse a Elvas o domínio dos cristãos comandados por Sancho II, este era o eixo estruturante da malha urbana, com a utilização da rua de S. Pedro. Paralela a esta, e já fora da muralha taifal, surgirá depois a rua do Cano, oficialmente Sá da Bandeira, e à posteriori uma terceira via, à qual dedico estas linhas, a rua do Espirito Santo. Uma das recordações que guardo, e que me retorna a esta rua, são as noites de princípios de verão, as festas do solstício, que a igreja católica transformou e cristianizou na efeméride de S. João Batista, apagando as memorias do deus romano Janus, e que em Portugal celebramos em conjuntos com S. Pedro e Santo António como santos populares.
Era nessa rua, como em muitas outras ao longo do centro histórico, que se celebravam os mastros, festas populares com muita sardinha assada e “bailo”. Recordo-me das bandeirinhas de papel que decoravam a rua oscilando lá no alto, enquanto eu corria e jogava, tentando fugir aos meus amigos e à colisão com aqueles que dançavam nessas noites quentes de junho em plena rua.
É uma rua estranha, talvez por estar dividida em dois tramos separados por umas escadas que lhe dão quase a sensação de fronteira e que seguramente lhe marcam a personalidade. Imaginem uma rua que se articula desde o adro da igreja do Espirito Santo, e que para vencer esse desnível utiliza as escadas fronteiras ao templo, delimitando o espaço nascente e poente da rua. Esta igreja do Espirito Santo, de fundação trecentista, foi demolida no rescaldo do liberalismo lusitano, e hoje o que era esse templo é o largo ocupado pela travessa Nova do Espirito Santo, e no qual se encontra uma lápide que perpetua a existência neste local do templo.
Outra lapida existe nesta rua recordando-nos que a tradição identifica que aqui nasceu Iria Gonçalves, mãe de Nuno Alvares Pereira, o Santo Condestável.
Regressar física e literariamente a esta rua, que também foi dedicada a S. Miguel em época medieval, é recordar-me da cantiga que entoava a minha avó e que dizia que nessa rua não se podia namorar, pois se de dia eram as velhas à porta à noite estorvavam os cães uivando.
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