Igreja de N. Sra. da Consolação ou do Sr. Jesus dos Aflitos ou das Domínicas de Elvas

Vista sobre a cabeceira da igreja das Domínicas, desde o coro alto, Elvas. 

Cada elvense chama de forma diferente a esta igreja, e há muito assim sucede. Ainda recentemente ouvi um visitante perguntar pela igreja das Domínicas recebendo como resposta que não sabia onde era, "esta é a Sé e detrás está a igreja dos Aflitos"! 

Detalhe da porta lateral das Domínicas, Elvas.

Ainda me recordo do tempo em que ali eram celebradas eucaristias a diário, ocultas pelo grosso pano roxo que isolava o interior protegendo-o dos ruídos mundanos. A igreja dos Aflitos é assim denominada, não pelo facto de não ter casa de banho, mas sim por ter albergado a imagem do Senhor Jesus dos Aflitos, aqui recolhida após a extinção do Convento de N. Sra. dos Remédios onde era venerada. Este crucifixo era de grande devoção no convento paulista de Elvas, sobretudo porque a ele se encomendavam aqueles que sofriam de peste e epidemias. Para os atuais crentes este Cristo crucificado será certamente o protetor contra o coronavírus que nos amargura a existência em 2020, sendo que para lhe beijar os pés, conforme se fazia antanho, o fiel devoto terá que subir até à igreja de Sta. Maria de Alcáçova, para onde foi desalojado nos anos 80 do século passado, quando se retirou da cruz original e passou a presidir o altar.

Cruz do Senhor do Aflitos que se guarda nesta igreja, Elvas.

Púlpito de ferro forjado medieval e ao fundo o altar de N. Sra. da Consolação.

A igreja do antigo convento de N. Sra. da Consolação é a mais original igreja elvense, em que todo o seu interior é uma surpresa para quem nela entra por primeira vez ou a olha com "olhos de ver". Do espaço conventual apenas nos chegou aos dias de hoje a igreja, dado que após o decreto de Joaquim António de Aguiar, todas as ordens religiosas foram extintas em Portugal, sendo no caso das ordens femininas concretizado na proibição de entrada de noviças. Assim, o cenóbio elvense das domínicas (leia-se freiras professas da ordem de S. Domingos) permaneceu habitado até à morte da última religiosa, o que veio a acontecer em 1862, levando ao abandono e ruína do convento renascentista, surgindo nesse espaço o largo 1º de Dezembro, uma escola primária e o cineteatro local.

A cúpula das Domínicas, Elvas.

O belo traço deste templo deveu-se a Diogo de Torralva, mestre-de-obras de D. João III, e um dos maiores arquitetos do renascimento e do maneirismo em Portugal, tendo deixado a sua marca no claustro grande do convento de Cristo de Tomar, no convento do Bom Jesus de Valverde de Évora ou no mosteiro dos Jerónimos de Lisboa, entre muitos outros, elevando assim o templo elvense a obra maior do renascimento português integrando nele todo o espirito do humanismo. O portal de entrada da igreja é disso exemplo, onde se podem observar a cruz dominicana e os bustos de quem por ventura seriam os patronos do convento ou santos da ordem.

Semicúpula do altar-mor das Domínicas, Elvas.

Quando em trabalho acompanho viajantes na minha cidade natal este é o espaço que estou seguro vai agradar. Ao aproximarmo-nos daquela desuniforme massa exterior não é expectável encontrar no seu interior a beleza das proporções que dão forma a este espaço sagrado. Há inclusive quem ao entrar pense tratar-se duma mesquita, pela sua amplitude, pelos azulejos setecentistas de padrão que a forram de alto a baixo, pelas colunas marmóreas que sustêm a cúpula e ainda pela forma octogonal do corpo da igreja. Não é de estranhar que Torralva tenha desenhado uma planta centralizada, de proporções áureas e na senda do Homem Vitruviano, de onde todos os humanistas beberam as noções do tamanho e do belo. Porém não podemos esquecer que esta igreja conventual substituí a igreja românica da Madalena Velha, de fundação templária e da qual poderá ter herdado a forma poligonal, típica à época das construções destes freires guardiães do Santo Sepulcro de Jerusalém.

Era neste espaço que tinham catequese os "castelões" e onde a D. Celeste ensaiava os cânticos que se ouviam nas celebrações que seu irmão, o padre Martins da Fonte, celebrava e que a muitos recordavam as suas aulas de história na Secundária elvense. 

Contudo há ainda outros segredos que se mantêm ocultos nas brumas do tempo e que esperam investigações para recuperá-los aos tempos presentes, e esta igreja tem os seus... Aquele cão de mármore, símbolo dos domínicos, que fareja entre os azulejos de padrão. Porque o deixariam emparedado?


Portal renascentista da igreja das Domínicas, Elvas.

Arquitrave de mármore, com pinturas (sec. XVI), igreja das Domínicas, Elvas.




Zimbório das Domínicas, Elvas. 

Sta. Catarina de Sena, numa tela atribuída a Pedro Nunes, Domínicas de Elvas.




TAMBÉM TE PODE INTERESSAR



Sem comentários

Com tecnologia do Blogger.